O Funeral do Faraó
Análise Expositiva de Ezequiel 32O capítulo divide-se em duas lamentações principais, separadas por cerca de duas semanas no calendário profético.
A primeira profecia ocorre no "décimo segundo ano, no décimo segundo mês, no primeiro dia" (Março de 585 a.C.). Note a data: Jerusalém já tinha caído há cerca de um ano e meio. A notícia já era velha. Agora, o foco é o fim do Egito.
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O Leão e o Monstro (v. 2):
Deus usa duas metáforas: "Você se considera um leão entre as nações, mas não passa de um monstro nos mares".
O Faraó achava-se nobre como um leão (rei da terra), mas Deus vê-o como um crocodilo (besta do rio) que apenas suja a água e faz barulho. -
A Rede Divina (v. 3-6):
Deus lança a Sua rede sobre o monstro.
A Carnificina: A descrição é gráfica. Deus deixará o cadáver do monstro em campo aberto para as aves comerem. O sangue do Faraó será tanto que "encharcará a terra até os montes" e encherá os vales. É a morte total do poder militar egípcio. -
O Apagar das Luzes (v. 7-8):
"Quando eu o extinguir, cobrirei os céus e escurecerei as estrelas".
Esta linguagem apocalíptica lembra a 9ª Praga do Egito (Trevas). Deus diz que, quando o Faraó cair, a "luz" do mundo antigo se apagará. O Egito era visto como o sol da civilização; a sua queda traz trevas geopolíticas. -
A Espada da Babilônia (v. 11-12):
A profecia deixa de ser metáfora: "A espada do rei da Babilônia virá contra você".
Os tiranos das nações (o exército de Nabucodonosor) destruirão o orgulho do Egito. -
A Paz das Águas (v. 13-14):
Depois da morte do monstro (Faraó) e do gado, ninguém mais turvará as águas do Nilo. Os rios correrão "tão lisos quanto azeite".
Significado: O Egito ficará tão despovoado e quieto que não haverá atividade humana para agitar a água. É a paz de um cemitério.
A segunda lamentação ocorre duas semanas depois (v. 17). É uma visão do Submundo. Ezequiel guia-nos numa visita guiada ao inferno para ver onde as superpotências terminam.
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O Destino Comum (v. 18-19):
O Egito, apesar da sua beleza, deve descer para o "mundo dos mortos" (Eretz Tachtit - terra de baixo).
Eles devem deitar-se com os "incircuncisos" (pagãos impuros). Para um egípcio que valorizava ritos funerários elaborados, isto era o horror supremo. -
A Galeria dos Impérios Caídos (v. 22-30):
Ezequiel lista quem já está lá à espera do Faraó. É um "cemitério VIP" da história antiga:
Assíria (v. 22): A antiga superpotência. Certa vez aterrorizou o mundo, agora jaz nas profundezas.
Elão (v. 24): Nação guerreira a leste da Babilônia (Pérsia). Antes causavam terror; agora carregam a sua vergonha.
Meseque e Tubal (v. 26): Povos guerreiros da Ásia Menor (Turquia).
Edom (v. 29): Os reis do deserto, agora deitados com os mortos à espada.
Os Príncipes do Norte e Sidônios (v. 30): Os fenícios. -
O Consolo Macabro (v. 31):
"O faraó verá tudo isso e será consolado quanto a todas as suas multidões".
O único "consolo" no inferno é saber que não se está sozinho. O Faraó perceberá que a morte é o destino inevitável de todo o poder humano que se levanta contra Deus. - A Conclusão (v. 32): "Espalhei pavor na terra dos viventes". Deus reivindica a autoria do medo. O Faraó, que tentou espalhar terror, agora é vítima do Terror de Deus.
Cumprimento Histórico e Profético
Profecia: "A espada do rei da Babilônia virá contra você" (v. 11).
Cumprimento: Tabletes cuneiformes babilônicos (fragmentos do Museu Britânico) confirmam que no 37º ano de Nabucodonosor, ele marchou contra o Egito (rei Amásis) e obteve vitória. Embora não tenha anexado o Egito permanentemente como província, ele quebrou o seu poder militar ofensivo, cumprindo a profecia dos "braços quebrados" e da humilhação.
Profecia: O Egito desceria à cova e perderia a sua glória (v. 18).
Cumprimento: A dinastia Saíta (a do tempo de Ezequiel) foi a última grande dinastia de faraós egípcios nativos a governar com esplendor independente. Em 525 a.C., os Persas (Cambises II) conquistaram o Egito, seguidos pelos Gregos e Romanos. A "multidão" e o orgulho do Egito independente morreram ali, e ele tornou-se vassalo por mais de 2.000 anos.
Profecia: Assíria, Elão e Edom estariam destruídos (v. 22-29).
Cumprimento: A arqueologia confirma que, no século VI a.C., todas estas entidades políticas colapsaram ou foram absorvidas. A Assíria já tinha desaparecido (612 a.C.). Elão foi absorvido pela Pérsia. Edom foi eventualmente empurrado para o deserto e extinto. A descrição de Ezequiel do "cemitério das nações" é um mapa preciso da geopolítica extinta da Idade do Ferro.
Síntese Teológica do Capítulo
A Democratização da Morte: O Sheol é o grande nivelador. Faraós divinos e reis bárbaros de Edom partilham a mesma cova. A morte despe o tirano de toda a sua propaganda. Diante de Deus, um império é apenas um cadáver à espera de ser enterrado.
O Terror de Deus vs. Terror Humano: O versículo 32 diz: "Embora eu tenha permitido que ele causasse terror... espalhei o meu pavor". Deus permite que tiranos assustem o mundo por um tempo, mas reserva o direito de aterrorizar os tiranos no final. O medo de Deus é a única cura para o medo dos homens.
A Realidade do Além: Ezequiel 32 é um dos textos mais gráficos do Antigo Testamento sobre a vida após a morte para os ímpios. Não é aniquilação (deixar de existir), mas uma existência consciente de vergonha, rebaixamento e companhia de outros rebeldes na escuridão.
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